Não apenas números

Todo dia no jornal se fala de morte.
Vítimas da guerra, do descaso, do azar, da violência, da crueldade humana.

E acaba-se por tomar essas mortes como números, como estatísticas. Faz-se isso inconscientemente, sem ter ciência de que era alguém como você. Que amava, que pensava, que sentia, que ria, que sofria, que tinha sonhos, sonhos interrompidos involuntariamente.
Sem ter ciência de que para cada uma vítima, pelo menos três de luto, três pessoas infelizes com a impotência diante disso, da morte, da guerra, da violência, do descaso das autoridades.

As pessoas reclamam, e reclamam. Reclamam do absurdo dessas guerras, desse abandono, porém não exigem mudanças; afinal, é tão mais fácil agradecer aos céus por estar seguro no seu apartamentinho, assistindo televisão, e não lá, na África, Oriente Médio ou, pensando mais próximo, nas favelas, sofrendo, morrendo, assistindo gente amada morrer, passar fome, frio, necessidades e carências de todo tipo...

Tão mais fácil fingir a si mesmo que acredita que "Tudo vai bem no melhor dos mundos", que apesar dos pesares tudo vai acabar bem e já está muito melhor do que já foi...

Comodismo maldito, que elimina esperanças, inimigo da paz, da justiça, de um mundo melhor. Que faz dos jovens indignados serem taxados de adolescentes rebeldes, e dos adultos, taxados de deslocados socialmente, e dos idosos como excêntricos pela velhice.

Comodismo instituído dia-a-dia, de forma tão subliminar que nem se percebe, que parece natural...

Por que aos homens só interessa a própria tragédia?